Igreja de São João Baptista

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Um templo austero

A pobreza ou a quase ausência de elementos decorativos e as suas linhas com ar exageradamente “arcaico”, de contornos manifestamente ingénuos, são as características que em termos latos poderão definir o templo de S. João Baptista.

Localizada no exterior do castelo e vila amuralhada de Ansiães, apresenta nave única, rasgada por duas frestas e capela-mor, carateriza-se pela ausência de portal frontal e sem exuberância decorativa nos tímpanos das portas laterais. A fachada é em silharia granítica e termina numa cornija suportada por cachorrada.

Os escassos elementos arquitetónicos de referência, dificultam a atribuição cronológica para esta igreja. As intervenções arqueológicas permitiram atribuir uma cronologia de construção pré–românica, com sucessivas adaptações e restauros durante a Baixa Idade Média.

A necrópole da igreja de S. João Baptista foi utilizada entre meados do séc. XI e o séc. XVI, com diversos tipos de enterramentos, sendo clara a associação do templo a uma necrópole de sepulturas escavadas na rocha.

Vista geral escavação

As escavações arqueológicas

Os resultados arqueológicos obtidos permitiram expor já uma primeira interpretação. Efetivamente, conclui-se que existem três momentos cronologicamente bem diferenciados de enterramentos no interior deste templo.

O primeiro e mais recente é expresso por sepulturas simples escavadas em terra que serão sempre posteriores à fase de remodelação aqui ocorrida nos finais do século XV; outro, intermédio, é corroborado por sepulturas escavadas diretamente no saibro com uma configuração antropomórfica onde, num dos casos, foi recolhido da mão direita do indivíduo aí sepultado um dinheiro que permite a sua datação relativa para a primeira metade do século XIII.

Uma fase mais antiga está representada por uma sepultura escavada no afloramento granítico, cujos contornos evidenciam características peculiares, surgindo com uma tipologia claramente antropomórfica e com uma particularidade sem paralelo conhecido em Portugal, como é o caso de um pequeno “nicho” escavado na sua parte superior direita, muito próximo da cabeceira, que continha os indícios orgânicos de aí ter sido colocado um recipiente de vidro.

Uma estrutura para fundir sinos

Fossa

A fossa de fundição de sinos foi construída na zona central da nave da igreja de S. João Baptista. É uma estrutura simples organizada em granito e com uma configuração aproximadamente elíptica. Mede longitudinalmente 145 cm e de largura 125 cm.

As juntas da alvenaria são ligadas por uma massa argilosa compacta de coloração avermelhada que permitiam um ambiente perfeitamente isolado. Ao nível da sua parte superior a estrutura começa a desenhar uma forma abobadada que poderá corresponder à necessidade do seu contorno acompanhar a forma do sino aqui colocado para fundição.

No período medieval, a fundição de sinos era um processo altamente especializado, geralmente realizado por mestres fundidores que viajavam de terra em terra para atender encomendas específicas.

Esta técnicas de fundição ancestrais eram operadas por fundidores especializados, muitas vezes ligados a coorporações de artesãos.

O metal usado era o bronze (liga de cobre e estanho), que era derretido em fornos alimentados por carvão ou madeira.

Os sinos tinham um papel essencial na vida medieval, marcando o tempo, chamando para orações e servindo como sinais de alerta em emergências.

Um templo cristão sobreposto à ocupação romana

A igreja de S. João Baptista implantou-se numa área extramuros adjacente ao espaço urbano de Ansiães, precisamente no local onde se desenvolveu a antiga ocupação romana. Aliás, a sua necrópole exterior é responsável pela destruição da maior parte dos níveis arqueológicos articulados com esse período cronológico, e o espólio recolhido na necrópole do seu interior mistura também, e não raras vezes, alguns materiais dessa ocupação.

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Uma igreja sem portal frontal

Do conjunto arquitectónico que caracteriza a igreja de S. João Baptista, o elemento que mais evidencia estranheza é, sem dúvida, a ausência de um portal frontal voltado a ocidente, ao contrário do que acontece na maioria das igrejas românicas portuguesas.

Efectivamente, o pano granítico voltado a oeste apresenta-se liso, sem qualquer abertura ou elemento decorativo de significância ou realce. As portas de acesso ao interior rasgam-se nas paredes Norte e Sul e exibem uma modesta plástica decorativa. Ambas ostentam tímpanos com uma fraca exuberância decorativa em que os elementos mais significativos dizem respeito a um riscado no tímpano da porta Sul e a um entrelaçado simples que envolve o tímpano da porta Norte.

Estaremos perante uma construção de raiz pré-românica com sucessivas adaptações e restauros durante a Baixa Idade Média? Se assim for, justifica-se a ausência do portal frontal, principalmente se pensarmos na existência de um primeiro edifício cuja construção precedeu as prerrogativas da igreja católica quando impôs a necessidade de uma orientação canónica dos seus edifícios religiosos.

Nesse contexto adquire também algum significado lógico a existência do arco apontado de características góticas que divide o corpo central da capela-mor. Uma análise realizada a partir de um estudo fotogramétrico permitiu individualizar algumas diferenças significativas entre os dois espaços que constituem a planta arquitetónica da igreja de S. João.

A capela-mor é efetivamente um acrescento. Um acrescento tardio que pode estar em consonância com a fase de remodelação ocorrida por volta do séc. XV. Para este período há provas arqueológicas de uma reestruturação do templo e não será de estranhar que essas remodelações tivessem como objetivo adossar uma nova estrutura ao corpo principal pré-existente.

Estudo fotogramétrico

Fotogrametrico

A realização de um estudo fotogramétrico, serviu para tentar apurar com algum grau de pormenor as características do aparelho construtivo da igreja de S. João Baptista.

É sobretudo a partir do alçado principal que se pode detectar algumas diferenças significativas no conjunto edificado. Não estamos perante um edifício de construção homogénea, com silhares siglados e de dimensões globais mais ou menos padronizadas. Pelo contrário, estamos perante um edifício onde está patente uma notória heterogeneidade dos elementos pétreos utilizados.

De uma forma geral, os silhares são de dimensões reduzidas e mal aparelhados. Se atentarmos no alçado principal, facilmente nos apercebemos dessas diferenças no aparelho: as primeiras fiadas enquadram grandes blocos graníticos sem proporcionalidade ou esquadria, onde apenas existe a preocupação de abrir um pequeno encaixe (técnica do “engalinhado”) para sobrepor e dar consistência aos silhares de menores dimensões.

O conjunto denota uma pobreza construtiva evidente, se comparada com outros templos românicos, pese embora o facto de estes panos graníticos serem depois sujeitos a um reboco geral pelo interior e pelo exterior do edifício.

O grande arcaísmo construtivo aqui patente é uma prova de que templo de S. João Baptistas não foi obra de mestre canteiro, podendo ser uma construção que reflete o trabalho e uma mão de obra pouco especializada, de cariz popular e pouco conhecedora da gramática decorativa e do eruditismo temático que estava subjacente à arte e ao simbolismo do românico erudito.

A par de um certo arcaísmo construtivo, impera também uma enorme modéstia decorativa. Os elementos que merecem maior ênfase são as duas portas laterais e duas frestas, uma localizada na parede da nave voltada a Sul, e a outra localizada na parede da nave voltada a Ocidente.

Por outro lado, a partir dos elementos gráficos reunidos com este levantamento fotogramétrico percebe-se com alguma clareza que a capela-mor é um elemento adossado a um corpo ou nave que nós supomos como pré-existente.